Elias de Lemos (Correio9)
Billy Baldo (Correio9)
Segunda-feira, 24 de julho de 2017. A rotina começa cedo. Adilso José Zava, 50 anos, acorda às 4 da madrugada e sua esposa Luciane Renock Zava, 36, se põe de pé uma hora depois. Mais tarde (?) às 6 da manhã, ela acorda a filha Katiane. O desjejum é feito e Adilso segue para a lavoura. Mãe e filha ficam em casa. Pouco depois das 9 horas ele retorna, pois faria uma viagem a Nova Venécia. No mesmo dia, à tarde, Katiane iria a Vila Pavão buscar uma chapinha de cabelo.
Adilso pede à filha para adiantar a ida e ela aceita. Os dois saem de casa e em poucos minutos vencem os 7 quilômetros que os separam do município de Vila Pavão. Ele a deixa no Centro da cidade e combina de reencontrá-la à tarde para voltarem para casa; porém, ela não voltou. Katiane Renock Zava, de 17 anos, desapareceu! Aquele dia mudou para sempre a rotina desta família.
O desaparecimento completa 2 anos nesta quarta-feira, 24 de julho. Apesar das investigações da Polícia Civil, dos apelos e da mobilização da família e dos amigos, ela ainda não foi encontrada.
Nesta segunda-feira, 22, o Correio9 foi o primeiro veículo de comunicação a entrevistar os pais da jovem e a visitar a casa da família, na região de Jacutinga [no Córrego da Rapadura], localizada a 7 quilômetros da sede do município de Vila Pavão, onde moram desde 1991. Lá, com trabalho árduo na lavoura, no cultivo de outras plantações e hortaliças e na criação de animais domésticos, retiram o sustento nos dois alqueires de terra que possuem. Durante duas horas e meia, a reportagem do Correio9 testemunhou os relatos emocionados de um casal que está sofrendo e vivendo em vigília à espera da filha.
A casa de dois quartos e uma agradável varanda, com vista para uma montanha, chama a atenção pela decoração. Adornada por imagens de diversos santos e esculturas sacras, ela desperta a curiosidade dos visitantes. Bem cuidada e cercada por flores e árvores frutíferas, ela abriga uma família católica, cujos pais se apegam na fé para enfrentar o drama que estão vivendo.
A jovem é filha única e, segundo os pais, ela sempre levou uma vida pacata e havia interrompido os estudos para ajudá-los na propriedade e cuidar de uma parte que tem da lavoura de café. A mãe, Luciane, afirmou que a filha não possuía o hábito de sair de casa e que passava muito tempo utilizando as redes sociais, o que tem contribuído para que familiares acreditem na possibilidade dela ter marcado um encontro com alguém naquela segunda-feira (24/07/2017). Eles informaram que a Polícia possui linhas de investigação, mas, até agora, não tem nenhum dado concreto.
O FIO CONDUTOR
Ao sair de casa, o telefone de Katiane estava “sem internet”, assim, ela deixou o aparelho em casa e levou o de seu pai. O aparelho foi entregue à Polícia para perícia, no entanto, não foi divulgada nenhuma informação quanto a isso.
Questionados se a Polícia fez o rastreamento do aparelho que estava com ela, eles não souberam responder. Afirmaram, ainda, que a Polícia Civil não esteve na casa, apenas a Polícia Militar.
Como é comum aos adolescentes, Katiane gosta de usar a internet e usa o aplicativo Messenger para se comunicar.
De acordo com a mãe, a decisão de interromper os estudos foi própria. Eles teriam insistido para ela continuar, mas, a distância de 7 quilômetros até Vila Pavão, a desanimara. Uma opção a 3,5 quilômetros seria o Ceier (Centro Estadual Integrado de Educação Rural). Porém, neste caso a questão é que a escola é em tempo integral.
A última imagem que se tem de Katiane é uma curta gravação captada por uma câmera de um supermercado próximo de onde ela foi vista pela última vez, feita às 10h49 da manhã, no Centro de Vila Pavão.
Os pais afirmaram que a filha não gosta de sair sozinha. Frequenta a igreja: “Quando a gente chega à igreja ela gosta de se sentar no meio, entre eu e o pai dela, ela não gosta de ficar de um lado de nós dois. Agora, quando a gente vai à igreja fica um vazio”, disse a mãe com a voz embargada. E prosseguiu corando: “Eu fico olhando as outras mães, sentadas com seus filhos…”.
Em seguida as lágrimas contrastam com o sorriso da mãe que narra uma brincadeira: “Eu brinco com ela, que ela é uma moça de 17 anos, mas, parece uma criança: quando ia dormir, chamava: – mãe, vem me cobrir”. O pai, também narra: “Eu brincava com ela: como você vai arrumar um namorado se você não sai de perto da gente!?”
A reportagem perguntou à mãe se – nos dias antecedentes ao desaparecimento – notou alguma mudança no comportamento da filha. Com a mão sobre o coração ela disse: “Sabe, no domingo eu senti que ela estava mais alegre do que o normal. À tarde eu estava deitada e ela deitou-se do meu lado e naquele momento parecia que ela queria me falar alguma coisa”.
O COMEÇO DA GRANDE DOR
Luciane explica como foi o começo deste enfrentamento: “Fiquei desesperada. Quando eu paro para pensar, bate um desespero! Eu fiquei uns dias na casa da minha irmã, mas eu falei: eu tenho que encarar isso. Eu sofro, mas sofro calada”.
O pai Adilso Zava relatou que passou quatro meses “sem fazer nada”: “Eu me levantava, da cama, pela manhã e deitava na varanda, não fazia nada, não cuidava da lavoura. Minha vida parou”, falou emocionado.
Ele enfrenta a dor e a angústia mantendo a certeza de que a filha vai voltar para casa: “Está sendo difícil, mas eu tenho que continuar vivo para receber a minha filha quando ela voltar. Estou sempre pensando nela”, afirmou.
Luciane diz que busca manter a rotina, mas que não consegue mais fazer certas coisas que faziam juntas, nem sequer comer coisas ou como a filha gosta de comer. Coisas simples como bater o feijão no liquidificador: “Ela gosta, sempre, de bater o feijão, eu me lembro começo a chorar, porque ela fazia questão de fazer isso”. [Às vezes eles se referem – à filha – usando o verbo no passado, outras, no presente].
Os pais disseram que desde que ficaram sem a companhia da filha só saem de casa para ir à igreja. “Nunca mais tivemos vontade de sair de casa, de ir a alguma festa porque é muito triste chegar a uma festa sem ela, ela estava sempre com a gente”, disse o pai.
UMA JOVEM CUIDADOSA E VAIDOSA
Além do ambiente de angústia, a estrutura da casa mudou um pouco desde que Katiane não voltou. O senhor Adilso decidiu e fez uma reforma, como se tivesse aprontando o lar para receber a filha.
O quarto da jovem permanece o mesmo: uma cama, uma cômoda e um altar decoram o ambiente. É ali no altar diante das imagens – do Sagrado Coração de Maria, do Sagrado Coração de Jesus Cristo, da Virgem Maria e de Nossa Senhora de Fátima – que rezam todos os dias pedindo ajuda para encontrarem a filha.
A cama está arrumada e as roupas foram empacotadas pela mãe. “Eu sempre as coloco ao Sol e lavo também, para quando ela chegar encontrar tudo no lugar”, disse.
A cômoda informa que Katiane é uma pessoa vaidosa. Há muita maquiagem, cremes e perfume sobre o móvel. E que é caprichosa também, tudo é organizado e uma caixa de sapato – em tecido branco e vermelho – customizada por ela guarda seus pincéis de maquiagem.
“Ela é uma pessoa que gosta de se cuidar”, disse a sua mãe.
O COTIDIANO COM OS PAIS
Katiane passava todo o tempo em casa, saía pouco, ajudava a família e ama animais. Sua fiel companheira é a cadelinha ‘Neguinha’. Sua mãe contou que elas passavam horas brincando e correndo em um terreiro de café próximo ao paiol. “Ela quase não vai em casa, fica o tempo todo aqui. Antes de acontecer isso [a ausência de Katiane] se minha filha estivesse em casa, ela não saía de lá”. Quando a equipe do Correio9 chegou a cadelinha estava lá e, quando saiu, ela permanecia no mesmo lugar esperando sua amiga.
Eles disseram que ela gosta de música sertaneja, “principalmente as mais antigas”. O pai disse que quando ela ficava sozinha em casa, toda a vizinhança do vale onde moram ouvia a música tocando: “Ela ouve música alta mesmo, ela faz barulho e canta junto”.
Gosta de cozinhar e prefere comer verduras e hortaliças. “Ela ama banana verde frita, se depender dela, ela frita banana verde o tempo todo”, disse a mãe, nostálgica.
Ela gosta, também, de batata frita, quiabo e aipim frito.
UMA PROCURA NO ESCURO, SEMPRE NA ESPERANÇA DE REENCONTRAR A FILHA
Katiane saiu de casa “com a roupa do corpo”, levando apenas o celular do pai e uma bolsa pequena. Ela possui uma conta bancária, cujo saldo, segundo seu pai, é de R$ 290,00. Ainda, de acordo com ele, ela não “mexeu” na conta (apesar de estar com o cartão na bolsa).
Os pais fizeram muitas viagens na tentativa de encontrar a filha. Cada informação que recebiam e recebem eles vão averiguar. Já estiveram seis vezes em São Gabriel da Palha. Receberam a informação de que havia uma moça em um calçadão em Colatina e foram para lá.
Estiveram, também, no Km 41 (Distrito de Nestor Gomes), em Jaguaré e Assentamento Gaviãozinho. Percorreram vários bairros de Barra de São Francisco onde fizeram panfletagem com fotos dela.
Mas, até agora, o desaparecimento de Katiane é um mistério.
A INVESTIGAÇÃO
O caso está sendo investigado pela Polícia Civil da Delegacia de Nova Venécia. O jornal Correio9 entrou em contato com a assessoria de comunicação da Superintendência da Polícia Civil do Estado do Espírito Santo.
A reportagem enviou 6 perguntas: 1) Qual ou quais as principais linhas de investigação? 2) A investigação foi concluída? 3) Se sim, qual a conclusão? 4) Se não, o que se descobriu até agora? 5) A investigação continua? 6) Se não, por quais motivos?
A resposta afirma que a investigação está em curso, porém, ocorre em sigilo.
No entanto, a reportagem apurou que há pelo menos duas linhas de investigação. Uma delas envolve uma pessoa que residia em Vila Pavão, enquanto a segunda envolve levantamentos em outro Estado. Todavia, diante do que a equipe apurou, e sabendo de que a investigação corre em sigilo, esta parte não será divulgada para não atrapalhar as investigações.
*Fonte: Jornal Correio9